Amir Klink

"Um homem precisa de viajar. Por sua conta, não por meio de histórias, imagens ou TV. Precisa de viajar por si, com seus olhos e pés, para entender o que é seu. Para um dia plantar as suas árvores e dar-lhes valor. Conhecer o frio para desfrutar o calor. E o oposto. Sentir a distância e o desabrigo para estar bem sob o próprio tecto. Um homem precisa de viajar para lugares que não conhece para quebrar essa arrogância que nos faz ver o mundo como o imaginamos, e não simplesmente como é ou pode ser; que nos faz professores e doutores do que não vimos, quando deveríamos ser alunos, e simplesmente ir ver." Amir Klink















quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Dia 14. Picolo giro à Milano.

Terça, 28 de Setembro de 2010.

Oiço barulho e desperto... era o café da associação a receber talvez os trabalhadores da restauração da igreja. Tomo o pequeno almoço e quando desço uma senhora já com alguns aninhos dá-me os bons dias com a oferta de um café. Em troca mostrei-lhe umas fotos e ficou encantada, tal como as outras amigas que entretanto iam chegando.

Dei uma volta para ver as obras da renovação da igreja e fiquei espantado! Como é que um lugar tão pequeno podia ter uma igreja tão rica por dentro? Na volta passei pela feira que se fazia na rua para mais umas fotos. Volto ao albergue, preparo-me para sair e uma das clientes diz-me “- Se vais a Milão tens que passar a Certosa e dorme em Robbio, que se ouve falar bem.”

Segui até Pavia nuns rápidos 30 km, e chego a uma cidade ao nível da de Piacencia. Reparei num pormenor diferente: uma das igrejas de pedra tipo arenito estava quase toda desfeita à face de fora, todas as colunas e estátuas não eram mais te suaves relevos. Quando chego à catedral estava em obras e no seu interior havia uma divisão enorme, deixando apenas uns 20 metros após a entrada.

Mas queria ir a Milão! Mais umas pequenas voltas e lá vou eu procurar a tal Certosa. Deveria ser muito gira mesmo pois era toda murada e no seu interior quase que aposto um meio medieval, mas estava fechada por mais 2 horas para o almoço e decido seguir. Pelo caminho paro numa pizzeria para comprar uma fatia e foi a melhor que comi até hoje... huuum, a base média mas estaladiça só no inferior, e o recheio... Capriciosa! Parabéns António, levas o troféu!


À chegada a Milão deparo-me com o quão grande ela é! Chegar ao centro foi tão difícil como Roma e quando cheguei... fiquei esmagado com a catedral! Isto pode parecer tolice da minha parte falar tanto dos edifícios religiosos, mas o certo é que toda a parte histórica e comercial está aí.


Visitei a catedral para carimbar a credencial de peregrino e depois as famosas galerias Vitorio Emanuelle, onde se encontram todas as grandes marcas de tudo, sem anúncios de saldo nas montras.





O tempo era curto e tive que sair daquela enorme cidade... Não foi fácil, mas lá consegui ir na direcção pretendida. Entrei numa estrada nacional e passados uns 20 km reparo que já estava a exagerar pois já tinha mais de 100 km e podia desgastar-me em demasia. O problema é que Robbio estava ainda a 30 kms e só aí tinha dormida gratuita. Entrei numa zona de campos de arroz e por estreitas vias asfaltadas segui até ao destino. Ao fundo do horizonte não sabia se o que via eram as nuvens ou os Alpes, tão alto que pareciam estar.


Chegado ao local pretendido procurei o pároco mas ele levou-me até à casa do município, onde era o albergue e ao que parece tinha já um peregrino... conheci-o e descansei.



Um abraço peregrino,

Samuel Santos.

Dia13. Hoje foi dose...

Segunda, 27 de Setembro de 2010.

Ontem o dia foi muito relaxante na pacata vila de Berceto.



Na praça da igreja apanhava uma rede wi-fi que me deixou carregar algumas fotos no facebook para além de ter actualizado o blog sentado ao sol... hum, e eu que adoro o sol! A ligação não era muito estável caia constantemente daí não ter visto a minha caixa de mail mas mesmo assim consegui ver os comentários... Obrigado santix, um bttista do norte - com tanto acompanhamento sinto-me tentado a conhecer-te quando de Santiago for para casa. A todos os outros que acompanham, mesmo que não comentem, podem sempre fazer um convite. Se calhar no caminho haverá sempre tempo para um café.

Às 16:00, como o convite à população anunciava, missa em honra a Don Giuseppe (e assim deveria ter escrito antes, aqui fica a correcção pois por telemóvel não consigo alterar os posts). Foi muito bonita a manifestação popular por toda a dedicação a este pároco, que durante o seu exercício (sempre nesta formosa vila) fundou a casa da juventude onde dormi, restaurou a igreja e dinamizou também as estruturas de apoio ao peregrino fazendo deste sítio uma vila etapa.

No final da missa um cântico com as crianças e à saída todas elas se meteram numa carrinha de transporte 9 lugares (pareciam sardinhas em lata!). A carrinha estava embrulhada e era mais uma prenda ao pároco e à colectividade.

Segui-se o banquete na sala maestra da casa da juventude, uma sala circular bem grande sem qualquer apoio no meio. Havia comida de sobra, não os nossos tradicionais frangos e leitão assado mas sim bolos, tartes e quiches! Dava para todos mas eu confesso que ao início não me sentia muito enquadrado e retirei-me um pouco. A minha roupa casual e de tom gasto contrastava com a demonstração de moda que toda aquela gente ostentava... e eu que não sou nada de vergonhas...

Só no final, quando já muita gente estava de saída é que me aproximei. Mesmo assim muita gente pensaria quem seria era aquela figura alta e esguia, até que me sentei e só um tempo depois quando toda a gente estava a parar é que tive coragem de me aproximar da mesa e comer algo, partilhando desta forma do convite que a todos era feito. Passado um pouco, talvez por me ver só, aproximou-se o presenteado padre e conversou um pouco comigo, disse-lhe que iria deixar o donativo que Paola me tinha oferecido no dia anterior e ele recusou. Acabei por lhe deixar um postal de Roma a agradecer (aqui fica a correcção daquilo que disse antes mas prometo que direi onde vou deixar o donativo). Apresentou-me a mais gente e quando dei por mim estava no grupo das pessoas que estavam a organizar a festa trocando experiências. No final fizeram um canto em coral que eu registei, despedi-me deles e desejaram-me boa viagem. Foi muito bom este momento!

De volta ao quarto alimentei um pouco mais o italiano com o guia que tinha comprado e dormi.

Na manhã seguinte... se o solarengo dia de ontem convidava a andar e eu repousei hoje chovia e fiquei sem saber que faria. Estive mais de uma hora até que me decidi vestir tudo o que tinha e fazer-me à estrada! Calças, t-shirt, casaco, corta-vento, impermeável, luvas completas, óculos e protecções de sapatilhas e acham que chega?


Vejam o resto... Fiz-me à estrada chovia um dilúvio, de Berceta até Cássio desci aos 750 metros e voltei aos 1000, apenas via entre a pala do capacete e os óculos na ponta em nariz que me protegia dos pingos que saltavam dos pneus. Fiquei com pena não ver a vista das terras por onde passava mas em Cássio havia um anúncio ao "salto em diabo" que me pareceu ser nada mais nada menos que uma enorme escarpa de onde de certeza se podia fazer base jumping... quem sabe um dia...



Daí em diante pensei que a descida fosse a minha boleia para sair do ambiente de montanha. A experiência que ganhei no geo-raid que participei no ano passado dizia-me que o tempo que faz em altitude pode não ser o que se faz no sopé da montanha (obrigado Queirós por este ensinamento). Mesmo assim a descida foi dolorosa, pouco mais encontrei do que meia dúzia de carros, um furão e dois peregrinos também totalmente equipados para a chuva.

Os travões por terem apanhado lama no sábado estavam vidrados e por mais força que fizesse eles apenas abrandavam... tive que parar para raspar os calços em tijolo para que não gastassem as jantes, estas já estavam completamente em cinza escuro do alumínio gasto. O resultado do trabalho foi melhorar em muito a travagem. Duas horas depois chego completamente gelado a Fornova, no fim da descida! A chuva pára e eu continuo para ver se aqueço, passo por mais um grupo a pé de uns 5-6 peregrinos. Pouco depois tiro o impermeável, as luvas para secar o que estava por dentro pois já estava a aquecer um pouco.

Sorte ou não, uns kms a frente começa de novo a chover e eu aproveito o alpendre de uma capelinha para almoçar! Foi dos sítios mais caricatos que escolhi, pois tento escolher sempre um no centro de alguma povoação. Meia hora depois, almoço tomado e chuva parada, sigo até Fidenza. Ao contrário do que pensava era uma cidade quase fantasma, com alguma indústria mas parecia eu que tinha mudado de país... ruas quase vazias e o pouco que preenchia parecia ser muçulmano... enfim, procurei algo de especial, não encontrei e segui.

Parei num supermercado um pouco mais além, comprei vinho (hummm...), presunto e queijo. Tenho que me alimentar pois, tal como me dizem por sms, estou magro. À saída estava um rapaz, Luigi que reparou na bandeira de portugal que trago num dos alforges e me perguntou quem era e porque tinha a bandeira. Falei com ele um pouco. Embora italiano conhecia muito da cultura portuguesa e ele próprio também era um viajante, pois conhecia bem mais que eu... parabéns Luigi pela tua experiência, gostei muito de te ter encontrado!

Pensando eu que apenas fazia mais 10 km, decidi continuar por ser cedo, passo por Piacenza e aí sim voltei à Itália que conhecia, ruas cheias de gente sempre na moda, palácios e edifícios históricos... grandiosa mesmo! Mesmo assim por me sentir bem decido continuar e ir até Calendasco, 15 km depois. Pela beira da estrada reparo que nas rotundas haviam tomates no chão e paro para ver se estavam bons. De certezam que caíram ainda verdes pois estavam com bom aspecto e apanhei uns 8 pequenos, não por necessidade mas sim pelo engraçado da ocasião.

Na chegada a voz que me responde pelo intercomunicador da casa onde tinha a informação que recebiam peregrinos diz-me que apenas albergavam pessoas do estado... talvez tenha entendido mal. Não tive remédio senão seguir mais 30 kms numa jornada que já estava mais que completa estava! Não sei como, talvez pelo descanso do dia anterior e também por ser sempre plano, com algum esforço se fez os 30 kms mais até Santa Cristina até ao oratório que tinha o mesmo nome do pároco do dia anterior, e querem saber mais? Don Antonio que foi quem gentilmente me recebeu com uma simpatia enorme. Já era noite escura fazia nesse dia 30 anos de pároco também... coincidência ou providência? Pensei comigo, afinal todo este esforço extra não tinha sido em vão tal foi a forma que fui acolhido. A festa dele apenas será no próximo fim-de-semana.

Tomei o merecido duche quente, jantei e fiz-me ao descanso depois de escrever este artigo. Os 150 kms de hoje não permitem muito mais...

Um abraço peregrino,
Samuel Santos

domingo, 26 de setembro de 2010

Atenção

Está a ser difícil colocar no blog as fotos devido a estar a utilizar o telemóvel.
Como por facebook é mais fácil vou passar a descarregar as fotos por aí.
Para quem não reparou está o link na coluna do lado esquerdo.
Espero que compreendam,

Samuel Santos.

Dia 12. Don Guioseppe, 50 anos de pároco.

Domingo, 26 de Setembro de 2010.

Acordo cedo para participar na eucaristia. Como do que tenho: um queqe, a última fatia de pão de forma com mel acompanhado de cacau e café com água fria. Durante a missa sentia os gêmeos das pernas aos pulos tal como no dia antes, mas julgava que pela noite passaria.

Comecei a ouvir o corpo e pensei que tal como Deus talvez não fosse má ideia descansar o sétimo dia. Além disso tinha visto um convite à população para a festa do aniversário dos 50 anos de serviço à paróquia do padre Guioseppe.

No final dou uma pequena volta pela aldeia...na noite anterior, talvez pelo cansaço, não tinha reparado com tanta atenção nos pormenores. As estreitas ruas romanas principais eram em calçada em xisto perpendicular com um "lancil" na mesma pedra ao nível no centro. A igreja, em pedra tosca à vista tanto no interior como no exterior, datava do início do milénio passado e tal como muitas outras casas tinha o telhado em pedra de xisto.

Vou até ao castelo, pobre como o meu de Alcobaça. Mesmo assim fez-me inveja pois vi nele aquilo que em muito dignificaria o nosso: este tinha sido alvo de escavação arqueológica e sobre ele acessos e passadiços metálicos permitiam aos visitantes ver aquela simples mas cuidada estrutura.

No retorno ao albergue encontro o pároco, peço-lhe se poderia ficar por mais uma noite e dou-lhe os parabéns por aquela bonita data. No albergue novo ao abrir os estores reparo que um deles estava avariado e recordo-me em meu ofício. Pego na chave multifunções da bike e arranjo-o. Noto que o minimercado do outro lado da rua já estava aberto e vou às compras. Acabei por tomar de seguida outro pequeno almoço porque pouco a pouco as feições da minha cara vão expressando cada vez mais sinais de perca de peso, nada de estranhar após mais de 700 km em tão pouco tempo. Por estes dias tenho vivido muitos encontros agradáveis mas nota-se bem o isolamento: não vejo televisão à muito e nem sei nada acerca do mundo, a minha única companhia além da fiel bicicleta que até agora deu zero problemas é o telemóvel do qual vos escrevo a todos, e me ocupa... daí escrever tanto. Se não for pedir muito gostaria de receber sms pois sentir-me-ia mais acompanhado, para quem não tem o meu número aqui fica: 00351 916 922 480. A resposta vou deixando depois pelos post seguintes do blog. Mandem tudo, piadas, notícias, felicitações, e se eu não conhecer algum dos que queiram enviar que se apresentem, vou gostar imenso de ver a minha caixa de mensagem cheia. Por hoje fico por aqui, amanhã conto o resto deste dia.



Cumprimentos,

Samuel Santos

Dia 11. Primeiro desafio Alpino, Passo della Cisa.

Sábado, 25 de Setembro de 2010.

Abro os olhos antes do despertador pensando que já era tarde porque pela janela entrava bastante luz com os tons de azul. Tomo o pequeno almoço e aproveito para verificar se a rede que tinha encontrado no dia anterior à porta da casa diocesana tinha net ou não, por sorte tinha.

Enquanto postava o dia de ontem chega a mesma irmã que me tinha recebido no dia antes e conto-lhe o que estou a fazer. Ficou maravilhada e então disse-lhe também que poderia acompanhar. Sem perder tempo chamou outra irmã que já entendia “destas coisas da internet” para falar comigo. Dei-lhe o endereço e ficamos a falar um pouco.

Pouco depois começo dia:olhando para o mapa penso em abdicar da praia (que estava próxima) e vou direito a Carrara mas em vez de ir plano... a estrada faz-me subir 200 metros. Tenho tempo para observar a zona... com a farta chuva que caiu no dia anterior o ar estava húmido, com as beiras a jorrarem água, a vegetação que era imensa e verde.



Com o início do escarpado dos Alpes logo à minha direita (mas a cerca de 4 km) sinto-me na minha adorada ilha da Madeira... um abraço para a Madeira, está aí alguém?

Carrara era mais uma pequena cidade que se compara aquela de onde parti, talvez um pouco maior, com as pedreiras ao alcance da vista no topo dos cumes, dando a ideia que estavam cobertas de neve, tão branco é seu mármore.



Paro na catedral para carimbar o passaporte e surge-me uma senhora pequena fazendo justiça ao significado do nome que tinha em hebraico, Paola. Recordei-me do peregrino Paolo com que me cruzei à uns dias e com quem troquei conversa e tirei fotos. Voltando à senhora, encontrou-me na sacristia que estava fechada e acompanhou-me até outra igreja. No caminho contei-lhe um pouco da viagem e dos sítios por onde já tinha passado e quando chegámos tive que esperar um pouco que o padre carimbasse a minha passagem. Enquanto isto, os seus olhos brilhavam de espanto e alegria até que me disse que estar comigo lhe tinha iluminado o dia e convidou-me a almoçar! Quem me conhece bem sabe que eu aceito quase sempre um convite mas este tive que pedir desculpa e não aceitar, por correr o risco de me encurtar o dia. Mas dei-lhe o endereço de blog para que ela acompanhasse também.

Quando o padre voltou deu-me a sua bênção e os parabéns por tamanha peregrinação, e quando me vou a despedir de Paola ela dá-me uma oferta para ajudar a viagem, e pediu que aceitasse. A oferta dela foi oferecida no albergue onde passei a noite seguinte, obrigado Paola!

Sigo caminho para fazer uns kms mais antes de almoço e fui até Aulla. Nessa vila quase fantasma, ao contrário da maioria, não encontrei o centro histórico com muito lixo pelo chão e como estava na hora por aí almoçei. Daí em diante o caminho ficava num vale bem marcado e até à próxima paragem os sinais indicavam 24 kms. Muito disfarçadamente vou subindo com 2 paragens pelo meio para a deliciosa fruta da época, uvas e figos!



Passo por Villafranca mas reparo que esta não é vila de touros e toureiros, talvez de pastores e ovelhas pelo cenário alpino onde estava enquadrada. De seguida Pontremoli - nesta vila tenho de decidir se paro com 80 kms feitos ou se sigo, uma vez que 25 kms depois tenho outro albergue. Decido seguir. Passando pelo centro vejo um cortejo medieval que mais parecia um concurso de 2 grupos mostrando suas músicas de trompetas e tambores, com figurinos manuseando bandeiras, muito diferente de tudo que já vira e digno de se ver!

Mas fazia-se tarde e tinha que seguir sem saber o que me esperava... dos 500 metros de altitude vou subindo, subindo, em estradas ao zig-zag onde vários grupos de motos passavam a desfrutar da estrada. Eu também ia, mas com fios de suor a escorrer! Uma coisa era certa: quanto mais subia melhor era a vista... até que me convenço que aquilo era trabalho para fazer no dia seguinte. A etapa de hoje ficava por alí, pois o cume da montanha estava cada vez estava mais fechado, o que significava que não havia passagem baixa, tinha que ser no topo.

Uns milhares de castanheiros mais acima eis que alcanço o Passo della Cisa, a 1041 metros, e que não só divide a região de Toscana de onde vinha para a Emília Romana mas também mudo de "distrito" de Lucca para Parma. Nesse topo percebo também a razão de tanta moto: um camião de uma marca de motos estava lá e parecia ser aquele o ponto de encontro de um passeio. Já se fazia escuro e eu ainda tinha que chegar a Berceto. Do outro lado a inclinação era mais tímida e com o frio que fazia tinha que ir pedalando para não arrefecer. Tive a noção de aquele ter sido o primeiro desafio alpino a ser transposto! Para os meus amigos que comigo andam de bicicleta sabem bem que mil metros de acumulado para mim é coisa de pequeno almoço, mas a jornada hoje teve seguramente perto de 2 mil, com a dificuldade de a bicicleta em vez de ter aquele som característico ôco das bicicletas de estrada (em carbono, que apenas pesam 6 kgs), ser uma de aço com pneus mistos e alforges que no total deve pesar uns 22 ou 24 kgs.

Segui estada abaixo até à casa della gioventú parrocchiale e quando a encontro as 19:25 vejo que estava completamente fechada e começo a temer o pior... para ajudar ou não, o telemóvel estava sem bateria! Penso em entrar numa pizzeria para comprar o jantar e ligá-lo e encontro um casal que me valeu, pois disse-me onde era a casa do pároco Guioseppe. Rapidamente fui até lá e pedi-lhe mil desculpas pela hora... justifiquei-me com a dura etapa mas o sorriso dele dizia que não me preocupasse, mostrou-me o sítio onde iria ficar e saiu. Estava tão cansado e frio que tomei banho, comi do pouco que tinha e deitei-me.

Um abraço peregrino,
Samuel Santos

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Dia 10. Desvio até Pisa.

24 de Setembro de 2010

08:00 da manhã, de barba feita vou comprar uns iogurtes para me tratar, entrego a chave do quarto na biblioteca a Luigi, agradeço mais uma vez a hospitalidade e dou-lhe uma tira de papel com o meu blog que imprimi em Monterigione, convidando-o a visitar. Ele gostou e agradeceu.

Pedalo uns fáceis 20 kms e chego à primeira paragem, Lucca, uma cidade circundada não por uma muralha mas sim por um morro muralhado por fora. Da ponta onde entrei medi 1500mts ao extremo mais longo da forma oval que fazia.

Passei por uma livraria e como tinha pensado comprei um guia de conversação Italiano-Português pois não me sinto bem não falar uma língua que tanta coisa tem idêntica. Foram 9 euros investidos no conhecimento e se aprender algo será esta a minha quinta língua, ao contrário do que pensava, que seria o alemão a ter esse privilégio.

No interior da cidade destacava-se a catedral de São Marino de pedra clara no exterior, e de arcadas pintadas a azul cobalto com figuras adornadas com ouro no interior... ouro sobre azul! Antes de deixar a cidade decido dar uma volta por cima em morro, mas só fiz metade... vi que os 5 kms de toda a volta eram necessários para a etapa. Mesmo assim valeu a pena ver, tinha uma estrada onde poderia ter duplo sentido embora fosse vedado ao trânsito e nela passeavam turistas e atletas no seu treino matinal.

Tal como tinha planeado ontem, daqui alongo um pouco a rota em 25 kms e vou até Pisa julgando que seria interessante e não podia estar mais certo! A cidade era muito animada, com ruas de montras cheias de turistas, atravessada por um rio que, tal como em Roma, leva água turva beje.

Quando cheio ao fim esperando encontrar a "torre di miracolo" ao acaso, paro num posto de turismo para carimbar a credencial e reparo que a torre ficava no lado de onde eu tinha entrado. Mas do mal o menos, estava a gostar do passeio e era por aí que teria que sair. Mais um mundo de turistas por ruas e praças diferentes, até que chego ao local pretendido e reparo que aquele é mesmo um dos locais a visitar a nível mundial! O número de turistas era enorme e quase toda a gente tirava fotos, fingindo que com as mãos segurava a torre inclinada.


Como tinha idealizado almoçar por ali procurei um local menos concorrido e eis que encontro a zona dos "pic-nicqueiros", ou turistas low-cost como lhes preferirem chamar. Fiz mais uma das minhas saladas de tomate com atum, esta até levou queijo mozarella fresco que tinha sido oferecido pelo padre Doriano. Os vizinhos do lado que estavam apenas a sandes e bolachas espreitavam pelo canto do olho, que eu bem reparei he he!

Mudo de roupa e vou até à catedral ao lado... Se a de Lucca era fantástica esta passava-lhe a perna por estar tão bem restaurada. O tempo não perdoa e tenho que seguir para apanhar um albergue aberto. Escolho o de Pietrasanta e faço uma estrada estreita em permanente curva-contra-curva mas a nível, muito agradável não só pela paisagem mas também por me tirar das estradas principais e do alcance desta gente louca a conduzir. Para além disso encontro uma escavação arqueológica com um mosaico exposto em perfeito estado.

8 kms antes do destino chego à praia e sinto-me de novo em Fiumicino. Estou um pouco pela praia, rumo pela marginal cheia de gente e no destino fico numa casa paroquial. Descubro o porquê do nome da terra: as pedreiras aqui extraem mármore branco puro, pedra nobre escolhida por grandes escultores, um deles próprio Miguel Ângelo no século 15!


Numa volta pela pacata vila visito as montras onde se encontravam muitas galerias de arte contemporânea. Ao cair da noite cai também uma tromba de água acompanhada de trovoada, vamos a ver como será amanhã.

Um abraço,

Samuel Santos.

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Dia 9. Conduzido por mapas.

Quinta 23/9.

7 da manhã, o telemóvel começa a tocar a mesma música que tenho no ring ding e hoje não quero falhar. Como disse ontem, tinha combinado com o padre Doriano oração e pequeno almoço de seguida.

Deixo para trás o pequeno castelo de Monteregione e à hora combinada (mais 5 minutos, como de costume) apareço. O local combinado era outra igreja de uma povoação próxima, mais um espaço digno de visita. Depois comemos com Patrik do Uganda e Luís Jorge Almeida, um brasileiro. Ambos trabalhavam para a paróquia. O tempo foi passando, de agradável que estava a ser, e eu tinha que partir.

Combinei encontro com Luís na Abadia Isola, que ele ia abrir a 4kms dali . Antes de partir o padre queria oferecer-me várias coisas para comer pelo caminho - tanto insistiu que eu aceitei. Para além disso ofereceu-me mapas da etapa que ia fazer hoje e propus-me a viajar por esses mapas.

Despedi-me calorosamente e segui com Luís. Chegando à abadia descubro que esta era antiquíssima, datava do ano 1001 feita pela ocasião da passagem do papa por aquele traçado de peregrinação. Olho para o relógio e... 11:15! Nem parecia que queria andar hoje. Lá segui, um pouco por asfalto mas maioria por alcatrão, e em pouco mais de uma hora alcanço San Gimiano.

A quantidade turistas era enorme! Se eu pensava que quando deixava Roma os monumentos terminavam estava bem enganado... e ainda bem! As aldeias, vilas e cidades... tudo é histórico, com muralhas e torres, abadias e catedrais, museus lojas restaurantes, enfim estou encantado com tudo aquilo que tenho encontrado!

San Giminiano tem 5 altas torres que em algumas fotos parecem as Twin Towers que alguém decidiu deitar abaixo, só que estas já estavam de pé séculos antes das outras serem feitas.

Embora tenha feito poucos kms decido almoçar por aí, escolho um parque onde naquela hora um casal artista de voz e guitarra demonstrava o bem que sabia tratar a música. Eu não era o único a ter gostado do local, mais turistas faziam aí o seu pic-nic, coisa que agora faço todos os dias, he he.

Faço-me à estrada e parece-me que me enganei. Fiz uns kms a mais, com mais subidas também, mas o certo é que naqueles 20 kms vi ciclistas como em lado algum. Acho que era uma rota de turismo e havia ciclistas de várias nações.

Como o tempo se fazia curto tive que deixar a navegação por mapas devido ao risco de tornar a errar e perder o albergue em Altopascio, até porque tinha que parar muitas vezes para confirmar o traçado que levava. Pelo caminho passou um casal a rolar a 32kms/hora e pumba, Samuel na roda deles uns 10 minutos!

Ao aproximar-me da povoação de destino o GPS mostra-me que havia trilhos e como estava com tempo decido experimentar um. Azar, tinha lagoas de água e lama e quase tive que voltar atrás... mesmo assim não correu muito mal!

Hoje o albergue é gratuito e quando perguntei onde poderia colocar uma oferta disseram-me que não havia, fazem mesmo questão de ser a custo zero, numa das instalações da Câmara relativamente novas.

Um abraço peregrino,

Samuel Santos

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Dia 8. Tanti auguri a te

Quarta , 22/9.

Parabéns a você é o que o título significa. De facto, tal como tinha previsto, os meus 30 anos seriam feitos algures pela Itália e julgo que não podia ter tido um dia melhor!

Eram umas 7 da manhã quando os sinos do mosteiro cisterciense de Abadia São Salvatore começaram a tocar como se houvesse fogo nas redondezas... felizmente não era caso, mas foi bom para despertar mais cedo do habitual.

Sou presenteado com um parabéns do meu room-mate peregrino Benois e como ele tinha tido a amabilidade de me ter pago o jantar, ofereci-lhe do que tinha para o pequeno almoço: banana, pão integral e mel.
Depois da despedida faço-me ao caminho, subo um pouco mais até 950 metros de altitude e depois aproveito a longa e muito agradável descida com pouco declive até aos 350 metros numa asfaltada estrada em zig-zag, lindíssima e com uma vista esplêndida!

Mais tarde tenho algumas dúvidas sobre que caminho tomar; como não tenho mapas e apenas o aparelho GPS confrontei o traçado que tinha com as possibilidades em asfalto até que escolhi por sorte aquela que julgo ter sido a melhor opção. Levou-me a Montalcino, mais uma das lindíssimas vilas forradas a fortaleza no alto de um cume... fantástico!

Decido almoçar por ali e sigo para aquela que foi a estrada mais inclinada que já fiz até hoje! Uma placa em italiano dava-lhe o nome de “estrada arranca ferraduras"... tinha apenas 20% de inclinação. Baixei até aos 150 metros.

Passo por Buonconvento e descubro que por azar perco os seus monumentais festejos por uma diferença de dois dias... Sigo para Siena e, uau, mais uma cidade cheia de turistas. Paro um pouco a escrever algo e a dar pasto a vista... isto não devia dizer... e visito o resto da cidade. No edifício da cidade uma altíssima e medieval torre e frente um enorme largo pavimentado em tijolo de burro. Para os habitantes aquela deve ser a praia da zona, pois lá tomavam banhos de sol.

Hoje queria muito net e forcei-me a procurar um MacDon(...)ds para perguntar como funcionava aqui em Itália. O rapaz de serviço disse-me que tinha que ter um número italiano. Mais uma vez a sorte sorriu-me: ele falava brasileiro e pude pedir-lhe o favor de me deixar usar o dele. Obrigado Guido! Pela tua ajuda pude postar todos os dias anteriores.

Já se fazia tarde e faltavam uns kms ate Montiregione. Tinham-me falado muito bem deste albergue, funciona pela igreja e tinha umas instalações muito boas, com cozinha equipada. Aproveitei para cozer umas massas para o jantar e lavei a roupa. Além disso tive o prazer de ser visitado pelo padre Doriano, muito sereno e atento às respostas das perguntas que me fazia acerca dos motivos da viagem. Quando lhe disse que fazia 30 anos ficou impressionado. Disse-lhe que ofereci a minha festa a Deus e que estava a ter um óptimo dia.

Ofereceu-me um gelado e enquanto comíamos falei-lhe do blog. Ficou tão curioso que acabámos por ir ver ao computador da paróquia, e deixou-me ficar mesmo depois de se ir embora...

Foi muito bom porque assim pude agradecer a todos os comentários de parabéns do meu Facebook e além disso instalar nele um tradutor automático para outras línguas. O meu “Obrigado!” padre Doriano.

Bem, vou dormir. Amanhã combinei com ele estar às 08:00 em oração numa igreja a 3 km daqui.

Um abraço,
Samuel Santos

Dia 7: Figos, uvas e amoras!

Terça, 21/9.


Acordo com a sensação de cansaço e perco a pressa...

Como do que tenho, assino o livro de visitas e saio. Admiro mais uma vez as muralhas de Viterbo e sigo pelos campos. Estava já a ficar um pouco tarde e dava para ver que o cansaço do dia anterior estava nas pernas - a jornada não parecia ser nada fácil.




O traçado leva-me até uma estrada em calçada romana e sinceramente, é mais difícil andar aí do que em terra batida pois os pedaços de pedra são maiores que o normal e os sulcos entre elas não deixam a bicicleta em paz.



Avisto ao longe uma povoação no alto de um cume e lá rumei eu, estrada romana acima. Chegando a Montefiascone visito uma cripta enorme que se destacava perto. No interior, devido ao casaco que a câmara municipal me ofereceu, fui abordado por um casal de brasileiros: Carmelo e Henriqueta de São Paulo. Conversei um pouco com eles acerca das suas e a minha viagem, deixei-lhes o meu contacto blog e espero que me contactem.



Segui para o outro lado da vila e uau, avisto desse lado o enorme lago de Bolsena com 3km de diâmetro com 2 pequenas ilhas no meio. Avanço para a vila que dá o nome ao lago e durante um troço decido voltar atrás a apanhar a estrada pois o trilho parecia estar a fechar demasiado e não queria correr o risco de ficar sem almoço e sem saída no meio do vale onde me estava a dirigir.

No caminho de volta encontro uma grande figueira junto a uma vinha e pensei: se juntar pão, as sobras de milho doce e grão que tenho faço uma refeição mais ou menos completa! Nem preciso dizer que pouco depois (sabe-se lá porquê!) estava sem energias e tive que me arrastar estrada fora até uma subida que sim, essa me assustou. Valeu-me a coca-cola que comprei numa máquina para ganhar asas e subir dos 350 aos 850 metros de altitude como se nada fosse.



Chegado a Piancastagnaio sou surpreendido com uma vista maravilhosa e como descobri que o meu mal era falta de açúcar decido parar para comprar um frasco de mel para comer com pão. O melhor de tudo era que finalmente Abadia São Salvatore estava a apenas 5 km e plano.

No destino procurei o albergue que era num mosteiro cisterciense tal como o de Alcobaça. O padre que me recebeu disse-me que já tinha estado pelas minhas bandas e que dos 84 anos que tinha já por ali estava à 58!



Como colega de quarto um francês chamado Benoir ou Benedito. Jantei com ele numa pizzeria e insistiu em pagar o jantar. Merci Benoir!


Um abraço,

Samuel Santos

Dia 6. Ciau Roma!

Segunda, 20/9.

Acordo pela alba pois tinha que sair cedo, sigo até à praça de São Pedro para lhe pedir que tenha uma boa viagem e me despedir da cidade dos monumentais monumentos, das milhares de fontes a deitar fartos fios de água 24 horas por dia, das pinturas onde o nome de todas as cores não são suficientes para as legendar, das ruínas e dos templos, enfim, ciau do outrora centro do mundo!



Saio da praça pelo seu lado direito já a bike marcava 75 kms, depois subo o parque natural de São Mário. Eu a pensar que era tudo plano... mudei logo de ideias! Mas valeu a pena pois no alto tinha uma vista fabulosa sobre a cidade. Passo por La Storta tentando não ser atropelado pelos malucos que conduzem por estas bandas e eis que o GPS me indica uma saída da estrada para uma zona com enormes rectas. É nessa rota que avisto o primeiro sinal a indicar os caminhos de Santiago. Em Campagnano di Roma (já com um bom tempo a pedalar) passo mesmo no meio da vila e ouço ao longe um enorme som que mais parecia uma pista de fórmula 1 do que uma estrada...
O almoço: uma simples salada com sardinhas de lata, tomate, milho e grão para repor.

Pela região de Sutri um campo de arqueologia com aquilo que parecia ser espaços para depositar os restos mortais. Passei também por um anfiteatro, mas este era autêntico por era escavado em vez de ser construido. Pouco depois perdi uma hora por ter que voltar atrás uma vez, que o caminho não tinha saída...


Como estava cansado parei em Capranica para um lanche e acabei por fazer os 30 kms que faltavam até Viterbo por estrada. Aí fiquei num centro paroquial, fui recebido por Patrick de braços abertos.

Pizza, cerveja e repousar dos 115 kms que tinha nesse dia.

Um abraço,

Samuel Santos

Dia 5. Santa Marinela!

Domingo, 19 de Setembro de 2010.

Amanheceu, e o dia prometia não ter muito sol.


Depois do pequeno almoço com Kate fomos até à praça de São Pedro apreciar uma vez mais a confusão de peregrinos ou turigrinos conforme cada um se sente, e tentar cruzar com Mercedes que tinha ido à sala de imprensa do Vaticano devido ao seu trabalho. Enquanto falávamos sobre a imortalidade e vida eterna esquecemo-nos das horas e acabamos por perder o comboio para Santa Marinela onde íamos ao barbeque para onde me tinham convidado na quinta-feira passada.

Acabamos por ir de carro mais tarde e descubro então Santa Marinela, uma pacata vila na costa mediterrânea 40 km a norte onde o sol brilhava sem reservas. Chegamos lá e eu não conhecia quem me tinha convidado mas por surpresa minha estavam lá grande parte das pessoas com quem me tinha cruzado nos dias anteriores. Os donos da modesta vivenda, os Andersons, eram uma família de australianos linda. Á muito, ou melhor, nunca conheci uma assim! Eles jovens, muito bem de aparência e a dar uma inesgotável energia ao grupo dos seus 5, sim 5 filhos dos 1 aos 11 anos. Enfim uma família daquelas que muitos desejariam ter... e a educação que eles tinham! Não consegui ver entre os miúdos uma chatice que fosse pois todos faziam o que queriam por si próprios.

O churrasco estava fantástico, sabores do mediterrâneo adoçados com um vinho verde tinto italiano cujo nome não me recordo, e enquanto se ia provando tudo soube mais um pouco de onde vinha toda aquela atitude por Mark, o dono. Contou-me que quase foi para Timor Leste depois de ter recebido na Austrália famílias inteiras vindas de lá, refugiados dos ataques da Indonésia.

Acabamos a tarde na praia para uns mergulhos e o Mark para uns rides de skiming com os miúdos, mas por pouco tempo pois a volta era de comboio e não o queria perder desta vez.

De novo em Roma, fui directo à capela de Santo António dos Portugueses para assistir ao concerto de órgão que me tinham convidado no dia anterior. O concerto seguiu o seu alinhamento lento de Bach, o músico estava colocado na frente e no centro da igreja voltado para o altar e no final como o público aplaudia sem parar eis que ele volta e começa a tocar sem pauta e... aí sim, o órgão mostrou todo o seu potencial. O ritmo era tão frenético que havia lugar para todos os tubos metálicos libertarem seus sons. No final todo o público novamente em ovação, muito mais que na vez anterior, foram saindo pouco a pouco e quando tento encontrar quem me tinha convidado para estar presente para lhe agradecer o convite reparei que não estava... provavelmente terá saído antes.

Tinha-se feito noite, e já se estava a tornar tarde. Fui beber um copo para a despedida com Mercedes na praça di Fiore.




Samuel Santos


domingo, 19 de setembro de 2010

Dia 4. "Habbemos Latte"

Sabado, 18 de Setembro de 2010.

Acordo de manhã no cantinho que Mercedes me tinha reservado no corredor. A pouco a pouco começo a aperceber-me que tinha conhecido alguém que além da boa disposição era também alguém com uma estreita ligação ao Vaticano. Isto porque durante o pequeno almoço (em que Marta também esteve) ofereceu-me algo de especial: leite fresco de vacas criadas no interior do Vaticano, o mesmo leite que o Santo Papa bebe! Tinha-lhe sido oferecido por um conhecido.
A minha expressão natural foi "-Habbemos Latte!" em tom de brincadeira pensando ao mesmo tempo que poderia estar a exagerar... mas a Marta desmanchou-se a rir e pronto, vi que também se pode brincar com a religião desde que não se exagere.



À saída fomos até à biblioteca da universidade católica de S.Josémaria Escrivá para me encontrar com padre Miguel, que tinha conhecido no dia anterior e me convidou para trocar umas palavras enquanto visitávamos um pouco mais de Roma.



Desta vez a visita tinha outro tema: a representação portuguesa em Roma, que tal como disse é muito digna. Falamos da viagem e seus motivos, da fundação do Opus Dei e seus princípios... deu que falar por muito tempo. Como a barriga já estava a dar horas fomos ao melhor restaurante de pizza de Roma segundo ele, e de facto... hum...



E ali bem perto ficava aquela que devia ser a melhor gelataria! Era, bem... indescritível... Ouro sobre azul!



Com o almoço em dia, visitamos a igreja de Santo António dos Portugueses, toda em diferentes mármores e adornada em talha dourada. Para além de estar perfeitamente restaurada tem umas pinturas lindas... e o mais curioso, o melhor órgão de tubos de Roma! Por essa ocasião convidou-me para ficar no dia seguinte e assistir a um concerto. Decidi aceitar.



Como só eu tinha disponibilidade por todo o dia, despedimo-nos ficando-lhe eu imensamente grato pela visita, pelo almoço e também as dicas para o resto da tarde. Comecei pela igreja francesa que tem imagens pintadas pela mão de Caravagio, merece a visita.



O panteão, uau, o único monumento romano ainda com o tecto original, um círculo gigante com a cúpula maior que já vi até hoje... gigante!

A igreja de San Petri com a estátua de Moisés feita por Miguel Ângelo e a basílica de São Paulo que é a segunda maior de Roma, totalmente reconstruída depois de um fogo no século 19, com uma dimensão indescritível mesmo. No topo um semi-círculo em cúpula pintada em tons de ouro com a imagem do Santo Apóstolo, cujos restos mortais estão no centro, numa zona escavada, colocando arqueológicamente à vista o sarcófago original. Junto estão 9 elos da corrente que segundo a história fora usada em são Pedro quando esteve preso aqui em Roma. Tenho imensa pena ter ficado sem bateria no telemovel para que podesse colocar aqui fotos...

Vão dizer que só falo de comida... mas o jantar que se seguiu fica também para a memória...
Mesmo ao lado da casa de Mercedes havia uma procissão e como ela estava ocupada com o seu trabalho de cobertura da visita do Papa à Irlanda disse-me para ir lá jantar com Kate. He he, cada coisa custava 1 euro: pasta, panini, salsicha, acqua, zumo ó vino! Seguiu-se a festa a que chamei "church festival", porque os miúdos da paróquia é que estavam a passar música bem alta mas tudo actual, um ambiente místico!



O café foi com o resto do grupo em Campo de Fiore, uma praça que tinha visto durante o dia como mercado e à noite vira zona de bares.



Foi muito bom ter chegado aqui sozinho e ter encontrado logo um grupo de novos amigos tão compatível! Enfim, torna-se difícil não acreditar na divina providência.
 


Um abraço,
Samuel.

sábado, 18 de setembro de 2010

Dia 3. Em Roma sê romano.

Sexta-feira, 17 de Setembro de 2010.

Acordo logo pela manhã bem disposto, nem que fosse pelo banho que tinha tomado antes de me deitar.

Dirijo-me à recepção para tomar o pequeno almoço que a rapariga me ofereceu como desconto (quem não pede...). Que bem que me soube! Pelo caminho talvez não tenha tanta sorte...



De seguida rumo até ao obelisco da praça de São Pedro. Tinha combinado estar às 9 horas com Kate, uma do grupo que conheci no dia anterior e que se oferecer para ser guia. Não soube que se passou mas ela não apareceu e eu segui para a basílica.



Entretato a fila tinha ficado gigante, mas mesmo assim até entrei relativamente rápido e ... uau uau uau uau, que grandiosa é a basílica! Quem não viu não consegue ter a noção de grandeza, tal como eu não tive quando me contaram.



São alas gigantes, umas atrás de outras em trabalho mármorista do melhor que já vi até hoje! No tecto, ou melhor na imensa cobertura, molduras de cor ouro a forrar e várias cúpulas com o traço de Miguel Ângelo... buonissimo! Mas não estava aí apenas para visitar, tinha que ir à sacristia pedir um documento que me credencie como peregrino afim de ter acesso aos albergues pelo caminho.



Fui recebido com uma gratidão enorme por alguém que não me conhecia de lado algum: o padre Bruno, que deve ter tomado da bebida da felicidade pois sorria a toda a gente como ninguém. Passou-me um documento que eu irei carimbar por todos os locais onde dormir, polícias locais etc.
Uma vez que que o caminho é enorme não vou procurar sítios onde o fazer, pois só os carimbos dos albergues já irão preencher muitas páginas. São esses carimbos que no final me atestarão como um peregrino afim de obter a Compostela (certificado em diploma de peregrino).



Depois sigo para Roma antiga. Esta cidade é mesmo Imperial! A quantidade de monumentos, basílicas e templos romanos justifica a enorme quantidade de gente de todas as nações que por estes lados se reconhece.



E mais uma vez já vou longo... Acabei por jantar com o grupo de jovens, hoje mais numeroso e dormir em casa de um deles para não gastar tanto.





Um abraço a todos,

Samuel Santos.

Dia 2. Rumar a Roma

Quinta-feira, 16 de Setembro de 2010.



Acordo já o sol vai alto, com a brisa fresca do mar preenchida de todos os aromas a que temos direito. Tempo de começar a pedalar de Fiumicino para Roma.



Pelo porto de pescadores adivinham-se embarcações que outrora traziam para duro solo os lastros cheios de vivo peixe. Continuando pela estrada nacional reparo na quantidade de lixo que a berma vai juntando... e eu a pensar que éramos só nós.

Entretanto percebo porque é que os automóveis Fiat não são feitos para durar: simplesmente porque encontrar um italiano que o conserve por muito tempo sem o pintar... é mesmo raro! É difícil encontrar um carro que não esteja batido ou raspado. A atmosfera, embora limpa, está cheia de gás carbónico, os carros são tantos que se nota a gasolina queimada, e o trânsito... caótico! Os carros ocupam até ao último milímetro e o que sobra chega para as muitas scooters se meterem.



Trinta km percorridos e chego a Roma e como diz o ditado “Em Roma sê romano”! Em vez de ir directo ao vaticano, entro guiado pelo GPS pela parte antiga (Via Aurélia) e... UAU! O Coliseu surge como se me quisesse assustar. Uau, uau, uau, o império romano revela o seu esplendor.




Sigo para o Vaticano à procura do centro mais barato que tinha nas informações e fui bater na porta errada mais certa que bati até hoje!


Eu explico: bati á porta do que pensava ser um centro juvenil. Apareceu um rapaz dizendo que estava num centro espiritual e não um albergue. De seguida apareceu também sorrindo Mercedes, uma "chica" mexicana que propôs logo a Bernardo que me convidassem para almoçar, e pronto, entreguei-me a eles, estava no sítio certo.
Mostraram-me o centro, que ficava no interior uma igreja que por fora tinha sido completamente absorvida pelas construções. O local albergava uma cruz que João Paulo II tinha oferecido àquela igreja para percorrer o mundo nas Jornadas da Juventude e é difícil descrever o que se sente quando estamos diante de algo com tanto valor simbólico, como se tivesse vida própria. Almocei a tradicional pizza com um grupo que foi crescendo e logo se propuseram a arranjar um sítio onde pudesse ficar.



Pela tarde fui dar uma volta a pé e quando reparei vi que tinha feito algo de extraordinário: dei volta a um país a pé em pouco mais de meia hora. Depois de pensar nisto pensei para mim mesmo: “-Sou mesmo ignorante! Eu que dizia que a viagem era por 5 países afinal posso juntar mais 1, o Vaticano.” Fica aqui a emenda.



Bem por hoje estou a alongar-me... Só para dizer que jantei com esses amigos e ficarei com eles até domingo. A dormida foi num hotel privado de Instituição de Formação Católica e Missionária de jovens.


Até amanhã!

Samuel Santos

Dia 1. Dia da partida!

Quarta-feira, 15 de Setembro de 2010.

Tudo parecia estar pronto, afinal muito faltava por fazer desde verificar o que levava ao decidir aquilo que não levava... mais um mails, banho e barba enfim cheguei um pouco atrasado ao ponto de encontro, almoço em casa da mãezinha.
De seguida às sardinhas assadas rumei a lisboa de camião com o meu irmão que passava mesmo frente ao aeroporto e começaram logo as dificuldades mal me despedi dele, o telemóvel não tinha bateria com tantos telefonemas e para ajudar o carregador estava na embalagem da bike, valeu-me a simpatia da menina da loja dos telemóveis que me deixou carrega-lo por meia hora...a preocupação era a minha mana que ia aparecer e não tinha como estar contactavel, problema resolvido e ela a ligar.



Depois para despachar a bicicleta, eu a fazer conta que tinha que pagar e parece que a rapariga estava disposta a fechar os olhos por apenas ter um volume, tinha era que tirar 5kg à caixa pois tudo estava dentro do mesmo volume e era despachado como bagagem de porão e assim à boa maneira tuga poupei 50 euros, hi hi hi.



O vôo correu como esperado e à chegada depois de recolher a bagagem era só pessoal espalhado no aeroporto a dormir...



 ...mas como não consegui montei a bike e vim dormir à praia que estava a 3 km, e diga-se de passagem, bem mais confortável a areia e o som do mar dentro do saco cama a olhar as estrelas...