Amir Klink

"Um homem precisa de viajar. Por sua conta, não por meio de histórias, imagens ou TV. Precisa de viajar por si, com seus olhos e pés, para entender o que é seu. Para um dia plantar as suas árvores e dar-lhes valor. Conhecer o frio para desfrutar o calor. E o oposto. Sentir a distância e o desabrigo para estar bem sob o próprio tecto. Um homem precisa de viajar para lugares que não conhece para quebrar essa arrogância que nos faz ver o mundo como o imaginamos, e não simplesmente como é ou pode ser; que nos faz professores e doutores do que não vimos, quando deveríamos ser alunos, e simplesmente ir ver." Amir Klink















sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Dia 23. Manhã nevoeiro, tarde soalheiro!

Quinta, 7 de outubro de 2010.


Cedo abro os olhos e abro a janela. omo tinha reparado no cartão que os meus hospedeiros me tinham dado, não estava numa simples casa de quartos mas sim numa quinta pedagógica! Talvez pelo cansaço nem tinha visto bem que tudo era novo e a decoração muito gira. Pela janela entram os sons dos animais e vejo também que pouco se via para além dos limites das cercanias da casa devido ao forte nevoeiro.

Escrevi um pouco e o relógio chegou às 8:30, hora combinada para pequeno-almoço. Desci para o rés-de-chão e já lá estava a dona Joelle com a mesa posta, iogurtes, pão com manteiga e vários doces. Para terminar, café! Conversamos muito, embora ela me dissesse que neste dia excepcionalmente iriam sair para um passeio de barco no Rhone, com almoço em Lion. Quando o sr Hubert se juntou acabei por confessar que na noite antes, sem saber como nem porquê, fui encaminhado para aquele lugar. Tinha sido Deus como que a dizer: acredita, vai em frente! Na realidade aquele era um pedaço de paraíso que estava reservado para mim. Deles recebi uma prenda de cada um: dela um doce de figos óptimo para a viagem, dele uma oferta para acender uma vela à virgem quando chegasse a Le Puy- Acabei por ficar aqui quase gratuitamente e certamente que não esquecerei este local tão depressa. Na despedida, umas fotos e sigo pelo meio do nevoeiro direcção a Bourg Argental para retomar o caminho.

Logo ao início comecei a comer fruta da época: amoras para quem gosta. Uns 15 kms depois, já com o sol a brilhar no completo azul celeste, chego à cidade. Como me esqueci de pedir um carimbo na quinta, aqui procurei o Hotel de Vile (que para nós é a Câmara Municipal) para me fazerem o comprovativo da passagem por este sítio. Acabo por encontrar o mercado e após uma volta retomo o caminho. Já sabia que ia doer, dos 500 metros subo aos 1030 para a passagem do Col du Tracol por um vale.

Quando cheguei olho para trás e a vista era magnífica: o azul celeste apenas era rasgado por pequenos riscos dos aviões que passavam. Pensei que seria este o ponto mais alto e que daqui ia ser sempre a descer... estava bem enganado! Desço de maneira muito suave (como eu gosto) e uns fáceis 15 kms após, estava nos 700 metros. Como faltavam 5 minutos para a 1 da tarde, e eu tinha pensado que só almoçava depois das 13 continuei sem reparar no novo empeno que aí vinha. Em 3 km subo 250!

Baixo novamente aos 800 e encontro a vila de... onde visitei a igreja de Notre Dame que tinha uma exposição permanente nas laterais de quadros do século 16, impressionistas em tinta sobre talha.

Por aí almoço à porta do gite e continuo, em ligeira descida. Quando dou por mim a estrada departamental abre em auto-estrada sem proibição a bikes numa subida que me faz desesperar outra vez... Os carros passavam muito rápido e próximo mas eu não tinha outra saída. Chegado ao topo venço a altitude por 1 metro (1031) e aí sim, sempre a rolar até Le Puy.



Pensava eu que esta seria uma pequena vila mas reparo que uns 4 kms antes já havia comércio, depois as zonas residenciais e pela margem do rio passo a última barreira natural e vejo a cidade... uh lá lá, como dizem com frequência os franceses! Vejo uma enorme estátua num monte e a torre da catedral – tenho muito para ver antes de partir, pensei eu.



Mas como a experiência já manda, primeiro encontrar onde dormir. No centro da cidade aparece um rapaz que reparou no tau que trago ao peito e na bandeira portuguesa do alforge esquerdo. “-És peregrino?” - perguntou ele em inglês. Mark levou-me ao gite onde ele também estava albergado - era alemão e ia partir no dia seguinte com outros mais. Eu, pelo acolhimento que recebi, vi que aqui seria um bom sítio para fazer nova pausa. “-Aqui oferecem a sopa ao jantar e o pequeno-almoço, a missa é as 07:00” - explicou-me o senhor que me recebeu. Durante o jantar éramos 10 e pela primeira vez estava num grande grupo de peregrinos, metade alemães.

Um pouco de conversa e descanso numa noite cheia de ressonar... he he, acabou-se o descanso a partir de aqui pensei eu...

Um abraço peregrino,

Samuel Santos!

1 comentário:

  1. Estive nessa cidade (Le Puy-en-Velay) 3 dias este Verão. Bela cidade essa com dois montes que parecem mini pães-de-açúcar do Rio de Janeiro.

    Andei 400 km à volta dessa cidade. É uma zona um pouco montanhosa a 700-900 m de altitude.

    Vou continuar a acompanhar a tua "descida" até Portugal.

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